ENCONTRO
DE TEÓRICOS
Na última Feira do Livro,
encontraram-se na Praça da Alfândega Piaget Vigotski e Wallon. Assim que se
cumprimentaram, comentaram um pouco sobre a feira e logo começaram uma
discussão sobre a aprendizagem humana:
Vygotsky – Piaget, tu também
trabalha com a questão do aprendizado, correto? Qual a tua teoria a respeito
deste assunto?
Piaget – Minha teoria é a Epistemologia
Genética, é uma teoria de etapas, que pressupõe que os seres humanos passam por
uma série de mudanças ordenadas e previsíveis. Nela o
processo de conhecimento se dá através da percepção de que o sujeito divide seu
mundo em estágios. Cada novo estágio
ocorre, apenas, quando há o equilíbrio, fruto das assimilações e acomodações
feitas no estágio anterior. Sendo assim, o conhecimento se dá a partir da ação
do sujeito sobre a realidade.
Vygotsky – Minha teoria, a
Histórico-cultural, o sujeito é interativo, uma vez que constitui conhecimento
a partir das relações intra e interpessoais. A partir desta teoria, o
conhecimento é proveniente das relações. A origem das mudanças que ocorrem no
homem, ao longo do seu desenvolvimento, está, segundo meus princípios, na
Sociedade, na Cultura e na sua História.
Enfatizo o papel da
linguagem e da aprendizagem nesse desenvolvimento, uma vez que a linguagem tem
um papel definitivo na organização do raciocínio, pois age decisivamente,
reestruturando diversas funções psicológicas, como a atenção, a memória e a
formação de conceitos.
Wallon – Sei que não me perguntaram, mas minha
teoria é a Gênese da Inteligência, centrada na psicogênese da pessoa completa,
na qual o ser humano é organicamente social e sua estrutura orgânica supõe a
intervenção da cultura para se atualizar. Penso no desenvolvimento humano,
estudando-o a partir do desenvolvimento psíquico da criança.
Piaget – Para mim, a
aprendizagem está subordinada ao desenvolvimento de estruturas cognitivas que,
muitas vezes, determina aplicações pedagógicas e didáticas. O conhecimento dos diferentes
estágios contribui para o levantamento de objetivos, atividades de ensino e
aplicação necessários para o desenvolvimento cognitivo.
Vygotsky – Eu acredito na
existência de relações recíprocas entre o desenvolvimento e a aprendizagem,
pois a aprendizagem impulsiona o desenvolvimento, e este, por sua vez, cria
novos patamares para a aprendizagem. Assim, o desenvolvimento se expande
através das interações sociais, nas quais, por meio da internalização, o
indivíduo se apropria do conhecimento, ocorrendo, desta forma, a aprendizagem.
Esse processo evidencia a fundamental importância das trocas e aquisições do
meio social.
Piaget - A aprendizagem
depende do estágio de desenvolvimento atingido pelo sujeito.
Wallon – Concordo contigo, Piaget, e complemento
afirmando que a passagem dos estágios de desenvolvimento não
se dá linearmente, por ampliação, mas por reformulação, instalando-se no
momento da passagem de uma etapa a outra, crises que afetam a conduta da
criança
Vygotsky - A aprendizagem
favorece o desenvolvimento das funções mentais. Embora concorde que a
aprendizagem ocorre muito antes da chegada da criança à escola, atribuo um
valor significativo à aprendizagem escolar, que produz algo fundamentalmente
novo no desenvolvimento da criança.
E como se dá a construção do
conhecimento segundo tua teoria?
Wallon – O processo de aprendizagem é
dialético, ou seja, não é adequado postular verdades absolutas, mas, sim,
revitalizar direções e possibilidades.
Piaget – Sou da opinião de que
o conhecimento se dá a partir da ação do sujeito sobre a realidade.
Vygotsky - Esse mesmo
sujeito não só age sobre a realidade, mas também interage com ela, construindo
seus conhecimentos a partir das relações intra e interpessoais. E é somente com
a troca com outros sujeitos e consigo próprio que os conhecimentos são
internalizados, assim como papéis e funções sociais.
Piaget – Acredito que o
sujeito se utiliza de dois processos na construção do conhecimento, eles são a
assimilação e a acomodação, que nada mais são do que a ação de moldar novas
informações para encaixar nos esquemas existentes e sua mudança pela alteração
de antigas formas de pensar ou agir. Dessa forma alcança o estágio que costumo
chamar de equilibração, que nada mais
é do que a tendência para manter as estruturas cognitivas em equilíbrio.
Vygotsky – Quer dizer que o
indivíduo constrói a compreensão do mundo, o conhecimento sozinho? Sou da
opinião que a aprendizagem na criança pode ocorrer através do jogo, da
brincadeira, da instrução formal ou do trabalho entre um aprendiz e outro mais
experiente. O processo básico pelo qual isto ocorre é a mediação (a ligação
entre duas estruturas, uma social e uma pessoalmente construída, através de
instrumentos ou sinais). Quando os signos culturais vão sendo internalizados
pelo sujeito é quando adquirimos a capacidade de uma ordem de pensamento mais
elevada.
Wallon – O desenvolvimento da criança me parece
descontínuo, marcado por contradições e conflitos, sendo o resultado da
maturação e das condições ambientais, provocando alterações qualitativas no seu
comportamento em geral.
A criança é essencialmente
emocional e gradualmente vai constituindo-se em um ser sócio-cognitivo. Antes
do surgimento da linguagem falada, elas se comunicam e constituem-se como
sujeitos com significado, através da ação e interpretação do meio entre
humanos, construindo suas próprias emoções, que é seu primeiro sistema de
comunicação expressiva.
Vygotsky – E quais são teus
principais objetivos com esta pesquisa?
Piaget - Meu principal
interesse era estudar o desenvolvimento das estruturas lógicas!
Vygotsky – Já eu pretendia
entender a relação do pensamento com a linguagem e suas implicações no processo
de desenvolvimento intelectual.
Wallon - Proponho o estudo
da pessoa completa, tanto em relação a seu caráter cognitivo quanto ao caráter
afetivo e motor. Para mim, a cognição é importante, mas não mais importante que
a afetividade ou a motricidade.
A conversa entre os três
teóricos prosseguiu. Caminharam até a Casa de Cultura Mário Quintana, onde, em
meio a muitos cafés, concluíram que, apesar dos diferentes posicionamentos
teóricos, todos enfatizam a necessidade de compreensão da gênese dos processos
cognitivos. Concordaram na não-consideração dos processos psicológicos como
resultados estáticos que se expressam em medidas quantitativas, valorizando,
sim, a interação do indivíduo com o ambiente e percebendo o indivíduo como
sujeito que atua no processo de seu próprio desenvolvimento.
Por Graziela Oliveira e Rodrigo Gustavo Heckler